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Alteração no Código de Processo Civil limita a escolha do foro processual pelas partes em contrato

  • Foto do escritor: Elano Collaco
    Elano Collaco
  • 10 de jul. de 2024
  • 4 min de leitura

Sancionada em 04/06/2024, a Lei n.º 14.879/2024 alterou o Código de Processo Civil (CPC) para impor limites à pactuação da chamada cláusula de eleição de foro, considerada um negócio processual decorrente do princípio da autonomia de vontade das partes contratantes – isto é, por meio da qual as partes “escolhem” o local (cidade/comarca) no qual tramitará eventual processo judicial discutindo o contrato. Assim, a mudança na lei busca restringir a possibilidade de escolha das partes contratantes do foro judicial onde poderiam vir a discutir quaisquer questões e litígios advindos da execução do contrato ao longo do cumprimento da avença. Com efeito, o caput do art. 63 do CPC, inalterado, dispõe que, nas relações contratuais privadas, as partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações. O parágrafo 1º do art. 63, a seu turno, condicionava a eleição de foro somente à expressa: (i) menção em instrumento escrito; e (ii) alusão à determinado negócio jurídico. Ou seja, atendidos tais requisitos (e desde que respeitadas regras de competência absoluta, sobre as quais não cabem disposição particular em contrário), as partes poderiam escolher livremente qual foro judicial seria responsável por eventuais disputas decorrentes do contrato. Por exemplo: dois contratantes, um do Rio de Janeiro e o outro de Belo Horizonte, poderiam escolher resolver eventuais litígios no foro da Comarca de São Paulo. Agora, com a nova redação art. 63, § 1º, do CPC, além das exigências explicadas acima, o foro escolhido deve guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes, ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando favorável ao consumidor. Logo, com exceção dos casos que envolvam o direito do consumidor, as disputas privadas não podem mais ser remetidas a qualquer foro de conveniência dos contratantes. Inclusive, o art. 63, § 5º, do CPC, acrescido pela nova lei, autoriza o juiz a declinar da competência de ofício (isto é, rejeitar que aquela ação tramite naquela comarca), sem prévia consulta às partes, caso perceba que a ação foi ajuizada aleatoriamente, isto é, em local que não guarde vinculação com o domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda – tendo em vista que, com a nova redação do CPC, tal atitude passou a constituir prática abusiva. Desse modo, voltando ao exemplo dado anteriormente, as partes domiciliadas ou residentes no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte poderiam pactuar que eventuais controvérsias deveriam ser dirimidas ou no Rio de Janeiro ou em Belo Horizonte, salvo se em outro lugar a obrigação devesse ser executada, única hipótese em que a ação poderia ser proposta em outro foro, como São Paulo, por exemplo. Ou seja: por exemplo, se duas partes negociam a compra e venda de um veículo, sendo uma residente em Belo Horizonte e outra no Rio de Janeiro, estas só poderiam eleger o foro de São Paulo se, no caso, a entrega do veículo, ou o pagamento por este, fossem realizados exatamente na cidade de São Paulo O novo texto da lei, portanto, busca evitar práticas adotadas com o intuito de obter vantagens processuais, como redução ou aumento de custas processuais, tempo de duração do processo ou até mesmo a busca por juízos ou tribunais que decidam determinada matéria de forma favorável à uma pretensão de quaisquer das partes. Diante disso, a escolha aleatória e injustificada do foro poderia resultar em prejuízo social em determinadas localidades, porque tais demandas sobrecarregariam tribunais sem qualquer conexão com o caso posto em debate. Vale repetir que, mesmo com a restrição imposta, foi mantida no CPC a previsão de que, antes da citação, caso o juiz repute abusiva a cláusula de eleição de foro, poderá declarar sua ineficácia de ofício e determinar a remessa dos autos ao juízo do foro de domicílio do réu (art. 63, § 3º). Caso assim não entenda, o réu, após ser citado, ainda poderá alegar a abusividade da cláusula de eleição de foro na contestação, sob pena de preclusão (art. 63, § 4º). Assim, ainda que o foro contratual guarde pertinência com o domicílio ou residência das partes ou com o local da obrigação, é possível que a cláusula seja declarada abusiva. Isso pode acontecer, por exemplo, pela falta de transparência, quando não esteja destacada no contrato ou não esteja disposta de forma clara e inequívoca, ou quando ambas as partes não tenham tido igual poder de negociação e a cláusula tenha sido estabelecida de forma unilateral, a fim de que a cláusula de eleição de foro não seja utilizada de forma a prejudicar principalmente consumidores ou partes que assinaram contrato de adesão. Salienta-se, por fim, que, certamente, algumas questões sobre o tema serão remetidas à apreciação do Judiciário. Por exemplo, a alteração legislativa é aplicável a todos os contratos já firmados, mesmo aqueles anteriores à Lei 14.879/2024, cabendo ao juiz analisar se o foro de eleição eleito pelas partes guarda a pertinência legal. Todavia, a nova redação do art. 63, § 1º, do CPC, não esclarece se a possibilidade de eleição englobaria o foro de constituição e/ou o de execução do contrato. De igual modo, ainda é incerto se haverá a aplicação de alguma penalidade em decorrência de eventual declaração de abusividade do ajuizamento de ação em juízo reputado aleatório. Assim, o alcance dos impactos da nova alteração no âmbito do Judiciário ainda é incerto, de modo que é sempre importante contar com uma equipe de profissionais especializados, que acompanhem o tema e possam auxiliar na celebração de contratos, de forma a mitigar eventuais intercorrências e surpresas futuras. Autores:

Luís Henrique Vicente | MBM Advogados –luis.vicente@mbma.com.brJoão Menezes Faria | MBM Advogados –joao@mbma.com.br

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