STF muda o jogo: Provedores de Aplicação de Internet poderão ser responsabilizados por posts ilegais sem ordem judicial
- Mariana Silveira
- 24 de jun.
- 4 min de leitura
Atualizado: 25 de jun.
Sabe aquele amigo que passa o dia repassando mensagens e posts em suas redes sociais (WhatsApp, Instagram, Twitter, entre outros) sem fazer muita análise sobre o conteúdo? Pois é, ele agora poderá sofrer consequências mais severas por estas atividades, já que o controle das plataformas digitais (com especial enfoque nas Redes Sociais) provavelmente será mais rígido a respeito de conteúdo ilícitos veiculados nestas plataformas a partir da conclusão do julgamento do STF.
Nos dias 12 e 13 de junho o Supremo Tribunal Federal (“STF”) formou maioria para ampliar a responsabilidade de provedores de internet, websites e gestores de aplicativos de redes sociais por danos decorrentes de atos ilícitos de terceiros. Parece grego? Vamos juntos compreender os reflexos deste posicionamento da Corte.
A utilização de ambientes digitais para comércio, conexão e acesso à informação, não é novidade, sendo um movimento que se intensifica nos últimos anos, em especial após a pandemia do Coronavírus. Diante deste cenário, temos os provedores de aplicações de internet (“Provedores de Aplicação de Internet”), termo que descreve quaisquer empresas que forneçam um conjunto de funcionalidades que podem ser acessadas por meio de um terminal de internet, abarcando aplicativos de rede social, websites e provedores de internet.
O julgamento ocorre no âmbito dos Recursos Extraordinários: RE 1.037.396 (Tema 987) e RE 1.057.258 (Tema 533), que discutem a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014). Esse artigo hoje determina que as plataformas só podem ser responsabilizadas se descumprirem uma ordem judicial específica para retirada de conteúdo ilícito.
O que está em jogo?
O centro do debate é: plataformas digitais devem ser obrigadas a agir mesmo sem provocação da Justiça quando se deparam com conteúdo nitidamente ilegais, como fake news, discurso de ódio ou incitação à violência? Para sete dos onze ministros da Corte, a resposta é sim.
Assim, o que está em pauta no STF é a constitucionalidade da limitação da responsabilidade das plataformas digitais à existência e descumprimento de decisão judicial que determine a retirada de conteúdo, em especial quando há ilicitude expressa do conteúdo vinculado.
No julgamento ocorrido nos dias 12 e 13 de junho sete dos onze ministros do STF já proferiram seus votos. O voto que mais chamou atenção foi o do ministro Alexandre de Moraes. Para ele, os Provedores de Aplicação de Internet devem ser tratados como meios de comunicação e, portanto, sujeitos aos mesmos limites constitucionais à liberdade de expressão. Moraes defendeu que as empresas sejam responsabilizadas civil, administrativa e, em certos casos, penalmente, por conteúdos promovidos por algoritmos ou publicidade paga — sobretudo quando divulgados por contas falsas ou não removidos com agilidade.
Propostas que mudam o cenário digital
Conforme já informado, o ministro Alexandre de Moraes sugeriu que os Provedores de Aplicação de Internet sejam tratados como meios de comunicação quando se fala em limites da liberdade de expressão, aplicando-se a eles os artigos 220 e 5º, IX da Constituição. Moraes, argumentou que as plataformas digitais deveriam ser responsabilizadas, tanto civil quanto administrativamente, por conteúdos promovidos por algoritmos ou publicidade paga, especialmente quando veiculados por contas falsas. Isso vale também para conteúdos que não sejam removidos rapidamente, caso sejam considerados como discurso de ódio ou antidemocrático, cogitando também a possibilidade de responsabilização penal em casos de omissão intencional da plataforma.
Ainda, entre as propostas, Moraes destacou a necessidade de as plataformas digitais terem representação no Brasil, identificarem conteúdos publicitários e seus responsáveis, serem transparentes em relação a algoritmos sem comprometer segredos industriais, e alertarem os usuários sobre o uso de IA em vídeos e áudios manipulados. Inspirado na legislação regulatória da União Europeia, sugeriu que plataformas com mais de 45 milhões de usuários mensais adotem medidas para proteger a democracia.
Além disso, defendeu que as plataformas digitais precisam agir para bloquear conteúdos que violem as regras do Código Penal, como fake news, discurso de ódio, incitação à violência, crimes contra a honra e conteúdos que contrariem a democracia. O Ministro também apoiou a ideia de responsabilizar marketplaces por anúncios de produtos ilegais, já que ganhar dinheiro com conteúdos ilícitos é um risco que as plataformas assumem na ausência de fiscalização sobre o que circula em sua plataforma digital.
Diante todos os pontos levantados por Moraes, ele sugeriu a criação de um órgão que envolvesse a sociedade civil, a Anatel e o governo, seguindo o modelo do Centro Integrado de Enfrentamento à Desinformação do TSE, para garantir fiscalização e combate à desinformação.
Votos dos Ministros
Ainda que não finalizado o julgamento dos temas, estando pendentes ainda os votos da Ministra Cármen Lúcia e dos Ministros Edson Fachin e Nunes Marques, o STF formou maioria para ampliar a responsabilidade dos Provedores de Aplicação de Internet sobre conteúdos expressamente ilícitos que circularem nestas plataformas digitais. Abaixo é possível se observar um quadro reduzido com os principais pontos e conclusões de cada voto:

E agora?
A análise que o STF está fazendo sobre a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet é uma questão chave para o futuro dos Provedores de Aplicação de Internet no Brasil. A tendência da Corte parece indicar uma nova forma de responsabilização das plataformas digitais, deixando de lado a necessidade de ordem judicial para remover conteúdos ilegais e impondo obrigações mais rígidas de monitoramento e prevenção por parte dos Provedores de Aplicação de Internet.
Apesar de ainda faltarem os votos de três ministros — Cármen Lúcia, Edson Fachin e Nunes Marques —, a maioria já está formada. O julgamento deve consolidar um novo marco de responsabilização, em que os Provedores de Aplicações de Internet não serão mais vistos apenas como intermediários tecnológicos, mas como agentes ativos no ambiente digital.
Para os usuários, o recado é claro: compartilhar conteúdo ilícito pode gerar responsabilização — e, agora, a fiscalização será maior. Já para as plataformas digitais, a mudança pode representar um divisor de águas. A tendência é que invistam mais em moderação proativa, inteligência artificial, checagem de fatos e canais de denúncia —para evitar punições.
Como reflexos desta decisão é muito provável que os Provedores de Aplicações de Internet passem a fiscalizar os conteúdos que sejam circulados em suas plataformas digitais, com finalidade de evitar a própria responsabilização, o que facilitará a identificação e responsabilização das pessoas físicas envolvidas na propagação de conteúdo ilícito nas plataformas. Autores: Vitor de Menezes V. Martins - vitor@msbm.com.br Mariana Silveira - mariana.silveira@msbm.com.br
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